domingo, 30 de junho de 2019

Fome

Fome
Pedro Buonano

Tive fome
Tanta fome
Que comi 
Meus olhos,
Devorei
Meus ouvidos

Cego e surdo
Mastigador
De mim mesmo,
Não pude falar.



sábado, 29 de junho de 2019

Lavoisier explicou melhor

"A perecibilidade das coisas e dos entes. Mas a perecibilidade das coisas existentes, sendo substituída por outras perecíveis que são substituídas pela perecibilidade de outras – a essa constância se pode, querendo, chamar de perecibilidade eterna: que é a eternidade ao alcance de nós. Mas Lavoisier explicou melhor."  [in Aprendendo a viver de Clarice Lispector]





domingo, 23 de junho de 2019

Fotografia

Fotografia
Pedro Buonano

Através da lente
Olhar o mundo,
Interpretar o lúdico
Congelar para sempre

No respirar silencioso
Acionar o disparo,
Na câmara escura
Aprisionar o raro

Captar imagens
Registar momentos
Interromper trajetórias
Cada frame uma história.

sábado, 22 de junho de 2019

Espera impaciente

 "O que chamo de morte me atrai tanto que só posso chamar de valoroso o modo como, por solidariedade com os outros, eu ainda me agarro ao que chamo de vida. Seria profundamente amoral não esperar, como os outros esperam, pela hora, seria esperteza demais a minha de avançar no tempo, e imperdoável ser mais sabida do que os outros. Por isso, apesar da intensa curiosidade, espero."
[in Aprendendo a viver de Clarice Lispector]



sexta-feira, 21 de junho de 2019

domingo, 16 de junho de 2019

Bicho na Gaiola


Bicho na Gaiola
Pedro Buonano

Bicho na gaiola
Não canta
Não voa
Pois não tem asas

Amuado
Se revolta
Faz barulho
Quer sair

Conformado
Se aquieta
Assovia
Finge aceitar

Dorme cedo
Bem cedinho
Pra nunca mais
Acordar


sábado, 15 de junho de 2019

Deus

"Mesmo para os descrentes há a pergunta duvidosa: e depois da morte? Mesmo para os descrentes há o instante de desespero: que Deus me ajude. Neste mesmo instante estou pedindo que Deus me ajude. Estou precisando. Precisando mais do que a força humana. E estou precisando de minha própria força. Sou forte mas também destrutiva. Autodestrutiva. E quem é autodestrutivo também destrói os outros. Estou ferindo muita gente. E Deus tem que vir a mim, já que eu não tenho ido a Ele. Venha, Deus, venha. Mesmo que eu não mereça, venha. Ou talvez os que menos merecem precisem mais. Só uma coisa a favor de mim eu posso dizer: nunca feri de propósito. E também me dói quando percebo que feri. Mas tantos defeitos tenho. Sou inquieta, ciumenta, áspera, desesperançosa. Embora amor dentro de mim eu tenha. Só que não sei usar amor: às vezes parecem farpas. Se tanto amor dentro de mim recebi e continuo inquieta e infeliz, é porque preciso que Deus venha. Venha antes que seja tarde demais."   [in Aprendendo a viver de Clarice Lispector]



sexta-feira, 14 de junho de 2019

Vida

"A vida impõe os mesmos reveses e tragédias para o otimista e para o pessimista, mas os otimistas conseguem enfrentá-los com mais tranquilidade" [Welington Luís Sachetti]




domingo, 9 de junho de 2019

sábado, 8 de junho de 2019

O que é Angústia?

"Um rapaz fez-me essa pergunta difícil de ser respondida. Pois depende do angustiado. Para alguns incautos, inclusive, é palavra que se orgulham de pronunciar como se com ela subissem de categoria – o que também é uma forma de angústia. Angústia pode ser não ter esperança na esperança. Ou conformar-se sem se resignar. Ou não se confessar nem a si próprio. Ou não ser o que realmente se é, e nunca se é. Angústia pode ser o desamparo de estar vivo. Pode ser também não ter coragem de ter angústia – e a fuga é outra angústia. Mas angústia faz parte: o que é vivo, por ser vivo, se contrai. Esse mesmo rapaz perguntou-me: você não acha que há um vazio sinistro em tudo? Há sim. Enquanto se espera que o coração entenda." [in Aprendendo a viver de Clarice Lispector] 



sexta-feira, 7 de junho de 2019

Sonho




"Quando se sonha sozinho é apenas um sonho. Quando se sonha juntos é o começo da realidade." [Miguel de Cervantes]







domingo, 2 de junho de 2019

A Torre

A Torre
Jarid Arraes

minhas paredes
desabaram

- só se ouviu
o som - 

oitocentos reais 
de tijolos cimento
azulejos rejunte
branco

- as paredes
foram
desabando - 

como todos 
os grandes
muros
políticos
protetivos
cativos
coloridos
mijados

- onde se escovam
os cansados - 

minhas paredes
cumpriram
seu tempo

sábado, 1 de junho de 2019

Janela

"Ter notícias suas é como abrir uma janela, mas ainda não é como abrir uma porta. Talvez repita demasiado a palavra porta, mas precisa entender que aqui essa palavra é quase uma obsessão e, embora possa lhe parecer incrível, muito mais obsessiva que a palavra grade. As grades estão aí, são uma presença real, admitida, compreendida em toda a sua chata magnitude. Mas as grades não podem ser outra coisa senão o que efetivamente são. Não há grades abertas e grades fechadas. Em compensação, uma porta é muitas coisas. Quando está fechada, e sempre está, é a clausura, a proibição, o silêncio, a raiva. e abrisse (não para um recreio ou para um trabalho ou para um castigo, que são várias outras maneiras de estar fechada, mas para o mundo) seria a recuperação da  realidade, da gente querida, das ruas, dos sabores, dos cheiros, dos sons, das imagens e do tato de ser livre. Seria, por exemplo, a recuperação de você e de seus braços e de sua boca e do seu cabelo e ah, de que adianta tentar dar voltas em um trinco que não cede, em uma fechadura empedernida." [in Primavera num espelho partido de Mario Benedetti]