|
Voo da Liberdade, by Lina Angélica Gumauskas |
E às noites pela janela,
Por entre galhos estendidos da cerejeira,
Ouço, na Pátria ressoam os grilhões
Para terras distantes ainda deportam os irmãos
De sua terra, de seu santo torrão natal...
a. Danute Lipciute
"Que encantadora e aprazível é a primavera na Lituânia. No entanto o mês de junho daquela primavera sedutora foi, para a nação lituana, muito funesto. No ano de 1940, no dia 15 de junho os bolcheviques se apossaram da Lituânia. Eles destruíram, aniquilaram tudo o que havia sido feito, construído ao longo dos vinte e dois anos. Espezinharam tudo o que era para os lituanos sagrado e valorizado. Um terror medonho varria o país todo. As prisões estavam abarrotadas de "inimigos do povo"; a cada dia os recém aprisionados eram deportados para o longínquo oriente. Mas o lituano duro e teimoso entranhado de corpo e alma a seu país natal, a sua língua e religião - não se rendeu. Defendia seus direitos e não pensava em se amoldar à nova vida.
Não agradou aos novos senhores - eles decidiram afastar todos os que se interpunham aos seus objetivos, aos que não se curvaram ao pai Stalin, não apoiavam suas mentiras e enganações.
Por isto, exatamente um ano após, ao raiar do dia 14 de junho de 1941, em todas as cidades e aldeias, nos campos e sítios notou-se um inusitado alvoroço: caminhões com membros do NKVD corriam de uma casa a outra, de um sítio a outro.
Por toda a Lituânia ecoou, cheia de medo e angústia, a pergunta - "Quem é levado?", "Porque é levado?" "Para onde é levado?" - As pessoas tomadas de surpresa não entenderam o que se passava, pensaram que eram levados os "inimigos do proletariado", os "aproveitadores do povo" , os "burgueses". Entretanto enganaram-se dolorosamente. Aos ocupantes não importava se a pessoa tinha posses, se era um coitado, se era funcionário público ou operário, se velho ou moço, se sitiante ou artesão. Importava-lhes, sim todo aquele em cujo peito ardia o fervor do amor à pátria, aquele que amava sua terra respingada de sangue, aquele que não havia vendido sua consciência, seu país, seus irmãos. Não levaram em conta os NKVDistas nem idade, nem preparo, pouco lhes importou se era um velho ou uma anciã mal parando nas pernas, não os comoveram lágrimas nem de mães nem de crianças, nem um tremor sacudiu suas mãos ao arrancarem os doentes de seus leitos.
40.000 pessoas, dentre jovens e velhos, crianças e adultos foram embarcados à força em vagões de transporte, como se fossem os maiores malfeitores, trancafiados, portas pregadas, sem luz, água nem ar puro e assim transportados para as longínquas estepes asiáticas e florestas da Sibéria. Muitos deles não alcançaram o destino final de seu calvário, morreram a caminho dele.
O silêncio opressivo da morte cobriu toda a nação. Cessou o riso, silenciaram as canções. "O que fazer?" , "Para onde correr?" , "Onde se esconder?". Todos temiam, tremiam e se escondiam. As matas se encheram de gente, os cemitérios fervilhavam à noite, as pessoas evitavam pernoitar em suas casas.
O aniquilamento da nação lituana não se encerrou com os acontecimentos de junho. Continuou ano após ano. Muitos de nossos irmãos e irmãs continuaram sendo levados ao longínquo oriente. E quantos dos filhos da Lituânia pereceram nas matas de nossa pátria.
Portanto, uma vez mais a nossa independência recuperada, libertos do jugo comunista e, tendo nós e nosso familiares sobrevividos, não podemos nos esquecer daqueles que perderam a vida longe de sua pátria, separados de suas famílias, de seu país, daqueles que não tiveram a felicidade de festejar a renascida e independente Lituânia.
Junho de 1941 deve ficar inscrito com sangue na história da Lituânia." [texto/depoimento de Nina Valavičiene]