domingo, 28 de abril de 2019

Última Deusa

        Última deusa
Alberto de Oliveira
 

Foram-se os deuses, foram-se, em verdade;
Mas das deusas alguma existe, alguma
Que tem teu ar, a tua majestade,
Teu porte e aspecto, que és tu mesma, em suma.

Ao ver-te com esse andar de divindade,
Como cercada de invisível bruma,
A gente à crença antiga se acostuma
E do Olimpo se lembra com saudade.

De lá trouxeste o olhar sereno e garço,
O alvo colo onde, em quedas de ouro tinto,
Rútilo rola o teu cabelo esparso...

Pisas alheia terra... Essa tristeza
Que possuis é de estátua que ora extinto
Sente o culto da forma e da beleza.


sábado, 27 de abril de 2019

Do you speak English?


"“Do you speak English?” - Es la frase que a menudo me hizo temblar en más de un establecimiento, a partir de cafés en Italia a las estaciones de tren en Japón. Lamentablemente, no es el peor arranque de conversación. Aquel se reserva para la explosión más flagrante de apenas comenzar una frase en inglés - a pesar de que el establecimiento no se encuentra en un país de habla inglesa. Suponiendo que alguien (o todos) habla inglés es, en mi opinión, la 
peor forma de una introducción y, a pesar de mis años de experiencia de viaje, todavía me cuesta entender por qué algunas personas simplemente no pueden aprender una o dos frases en el idioma local. Seguramente el mundo sería un lugar mucho mejor si hubiéramos dedicado unos minutos para memorizar algunas palabras en otro idioma y estoy seguro de que haría felices a muchos locales a lo largo del camino."  [in Do you speak English? de Wayne Parry]



sexta-feira, 26 de abril de 2019

domingo, 21 de abril de 2019

Soneto


Soneto
Álvares de Azevedo (1831 -1852)
 

Pálida, à luz da lâmpada sombria,
Sobre o leito de flores reclinada,
Como a lua por noite embalsamada,
Entre as nuvens do amor ela dormia!

Era a virgem do mar! na escuma fria
Pela maré das águas embalada!
Era um anjo entre as nuvens d'alvorada
Que em sonhos se banhava e se esquecia!

Era mais bela! o seio palpitando...
Negros olhos as pálpebras abrindo...
Formas nuas no leito resvalando...

Não te rias de mim, meu anjo lindo,
Por ti — as noites eu velei chorando,
Por ti — nos sonhos morrerei sorrindo!


sábado, 20 de abril de 2019

Bonjour Messieurs

—  Bonjour Messieurs. Service de la navigation de la Seine, Arrondissement Champagne, sou o cabo Levec — falou ele rapidamente.
Era perceptível como o homem amava sua posição. Perdu estava quase esperando que o cabo Levec lhe desse uma multa pelo abandono não autorizado da própria vida.
—  Infelizmente, sua placa de Navegação Fluvial Francesa não está visível. E peço que o senhor me mostre os coletes salva-vidas obrigatórios, por favor. Obrigado.
—  Vou ali limpar umas janelas — disse Jordan.
Quinze minutos, uma reprimenda e uma multa depois, Monsieur Perdu esvaziou o caixa e o dinheiro que tinha nos bolsos em troca de uma placa de navegação em águas francesas, um conjunto de coletes salva-vidas neon, que eram obrigatórios nas eclusas do Ródano, e uma edição oficial das diretrizes da NFF. Mas o dinheiro não foi suficiente.
—  Então — disse o cabo Levec. — O que fazemos agora?
Havia um brilho de satisfação em seus olhos?
—  Por acaso o senhor gosta de ler? — perguntou Perdu, e sentiu que murmurava envergonhado.
—  Claro. Não considero correto esse costume bobo de botar no mesmo barco homens que leem e fracotes e afeminados — respondeu o gendarme fluvial, enquanto acariciava Kafka, que fugiu dele com a cauda empinada.
—  Posso oferecer talvez um livro… ou alguns livros como saldo do pagamento?
—  Bem, posso levá-los em troca dos coletes. Mas o que fazemos com a multa? E como os senhores querem pagar a taxa de detenção? Não tenho certeza se os proprietários da marina são muito… fanáticos por livros. — O cabo Levec pensou um pouco. — Sigam os holandeses. Eles sabem onde almoçar e atracar de graça.
Quando passaram pelas estantes de livros no ventre de Lulu para que Levec pudesse escolher o pagamento do saldo, o cabo da NFF virou-se para Max, que polia a janela ao lado da poltrona de leitura e evitava olhar diretamente para o gendarme.
—  Ei, o senhor não é aquele escritor famoso?
—  Eu? Não. Com certeza não. Eu sou… hum… — Jordan olhou rapidamente para Perdu — … filho dele, um vendedor de meias esportivas totalmente normal.
Perdu encarou-o. Jordan havia acabado de se oferecer para adoção?
Levec pegou A noite de uma pilha. O gendarme examinou a imagem de Max na orelha do livro.
—  Tem certeza?
—  Hum… talvez seja eu, sim.
Levec deu de ombros, compreensivo.
—  Claro. Com certeza o senhor tem muitas fãs.
Max mexeu nos protetores de orelha que trazia ao redor do pescoço.
—  Sei lá — murmurou ele. — Pode ser.
—  Bem, minha ex-noiva amou seu livro. Falava dele sem parar para mim. Pardon, digo, o livro do camarada que parece com o senhor. Talvez o senhor pudesse… escrever o nome dele aqui?
Max assentiu.
—  Para Frédéric — ditou Levec —, meu grande amigo.
Max escreveu a dedicatória com dentes cerrados.
—  Ótimo — disse Levec, e abriu um sorriso para Perdu. — Seu filho também vai pagar a multa?
Jean Perdu assentiu.
—  Mas é claro. Ele é um bom rapaz.
Depois de Max esvaziar os bolsos e entregar algumas notas e moedas de pouco valor, os dois ficaram lisos. Com um suspiro, Levec pegou outras publicações recentes “para os colegas” e um livro de receitas, Cozinha para solteiros.
—  Espere aí — pediu Perdu.
Em seguida, pesquisou rapidamente a seção “Amor para principiantes” e pegou a autobiografia de Romain Gary.
—  Para que isso?
—  O que o senhor quer saber é o que isso cura, caro cabo — corrigiu Perdu com delicadeza. — Cura a decepção de saber que nenhuma mulher nos ama mais do que aquela que nos deu à luz.
Levec enrubesceu e saiu bem rápido do barco-livraria.
—  Obrigado — sussurrou Max.
Quando o barco da gendarmerie se foi, Perdu teve mais certeza ainda de que romances sobre fugitivos e aventureiros fluviais deixava de fora coisas tão banais como selos tributários e multas por coletes salva-vidas.
—  O senhor acha que ele vai contar para alguém que estou aqui? — perguntou Jordan quando o barco policial se afastou.
—  Por favor, Jordan. O que há de tão terrível assim em conversar com algumas fãs ou com a imprensa?
—  Eles podem perguntar em que estou trabalhando?  [in A Livraria Mágica de Paris de Nina George]



sexta-feira, 19 de abril de 2019

domingo, 14 de abril de 2019

Motivo

Motivo
Cecília Meireles (1901 -1964)

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço, ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
— mais nada.

sábado, 13 de abril de 2019

Poirot x Japp

[ ... ]
... "Japp caminhou em sua direção, enquanto Hercule Poirot demorava-se a percorrer o quarto com os olhos.

   Era um quarto bem maior que o outro. Tinha uma janela avarandada e, enquanto o outro era simplesmente um quarto de dormir, este era uma combinação de quarto de dormir com sala de visitas.

   As paredes eram em tom prateado e o teto em verde-esmeralda. As cortinas eram em verde e prateado, com padrões modernos. Havia um divã com coberta verde-esmeralda em seda brilhante e diversas almofadas prateadas e douradas. Havia ainda uma grande escrivaninha em nogueira, uma cômoda também em nogueira e diversas cadeiras em estilo moderno, em cromo brilhante. Numa pequena mesa de tampo de vidro estava um grande cinzeiro cheio de pontas de cigarros.

   Hercule Poirot farejou o ar, delicadamente, e encaminhou-se para Japp, que olhava o corpo.

   O corpo tinha evidentemente escorregado de uma das cadeiras de cromo e era de uma mulher jovem, de seus 27 anos, com cabelos louros e feições delicadas. Havia muito pouco make-up no rosto — era um rosto bonito, mas melancólico e não muito inteligente. À esquerda da cabeça via-se o sangue coagulado e os dedos da mão direita seguravam uma pequena pistola. A moça usava um vestido simples, verde-escuro, abotoado até o pescoço.

   — Bem, Brett, qual é o problema?

   — A posição parece perfeita — respondeu o doutor. Se ela matou-se com um tiro, o corpo provavelmente teria escorregado da cadeira e caído nesta posição. A porta estava trancada e a janela fechada por dentro.

   — Então, qual é a dúvida?

   — Dê uma olhada na pistola. Eu ainda não a toquei — estou esperando pelos peritos em impressões digitais. Mas é fácil ver o que quero dizer.

   Poirot e Japp ajoelharam-se e examinaram a pistola com cuidado.

   — Estou percebendo — disse Japp, erguendo-se. Está na curva da mão. Parece que ela a está segurando, mas na verdade não está. Mais alguma coisa?

   — Muitas. A arma está na mão direita, mas a ferida é acima do ouvido esquerdo. O ouvido esquerdo, veja bem.

   — Hum — disse Japp. Parece que isto liquida o assunto. Deve ser impossível segurar uma pistola e dispará-la naquela posição com a mão direita.

   — Completamente impossível. Você pode torcer o braço, mas duvido que possa disparar.

   — O caso é bem óbvio. Alguém matou-a e quis dar a impressão de suicídio. Mas e a porta e a janela que estavam fechadas?

   O inspetor Jameson tinha a resposta pronta."

 [ ... ]               [in Assassinato no Beco de Agatha Christie]



sexta-feira, 12 de abril de 2019

Sábio




"Ninguém é tão sábio que nada tenha para aprender, nem tão tolo que nada tenha pra ensinar."
[Blaise Pascal]




domingo, 7 de abril de 2019

Soneto de abril



Soneto de abril
Ledo Ivo



Agora que é abril, e o mar se ausenta,
secando-se em si mesmo como um pranto,
vejo que o amor que te dedico aumenta
seguindo a trilha de meu próprio espanto.

Em mim, o teu espírito apresenta
todas as sugestões de um doce encanto
que em minha fonte não se dessedenta
por não ser fonte d'água, mas de canto.

Agora que é abril, e vão morrer
as formosas canções dos outros meses,
assim te quero, mesmo que te escondas:

amar-te uma só vez todas as vezes
em que sou carne e gesto, e fenecer
como uma voz chamada pelas ondas.



sábado, 6 de abril de 2019

Luz sépia

[ ... ]
"...É sábado de manhã e eu acabei de tomar o café. A vizinha faz barulhos como sempre, a casa precisa de cortinas, pratos limpos e definitivamente não precisa de barulho. Sábado de manhã é o único momento em que eu consigo ver a luz sépia que entra pela janela da sala e eu não quero nada além disso. É sábado e eu posso escutar música sem os fones, e coloco Billie para cantar “Blue Moon”, porque me disseram que hoje vai aparecer no céu a maior lua dos últimos 20 anos. É sábado e eu finalmente tenho tempo para pensar em como seria. Nós dois juntos. Porque me permito a saliência de criar uma vida à distância e vejo você acordando cedo para correr e me deixando na cama, e depois me acordando pra visitar seus pais, e me levando na feirinha daquela rua e para aquele restaurante polonês all you can eat. Me deixará sozinha à noite para escrever enquanto eu já teria alguns amigos na cidade e sairia para dançar. Meu livro acontecendo aos poucos e você fazendo cara de surpreso por eu de fato ter algumas leitoras queridas que consideram alguma coisa nesta literatura menor que é falar de si mesma enquanto você não entende o quanto de material você me dá e o quanto este nosso colchão jogado no chão do quarto parece mais ficcional do que qualquer história inventada. Não seríamos felizes. Eu teria me apaixonado por você de novo (como da primeira vez, dois anos atrás), um homem que não sabe amar, mas que merece um afago por ter tentado, e eu amaldiçoando seu passado, que amaldiçoou a você mesmo no dia em que ela te deixou. E eu voltaria pra cá, e me mudaria para a mesma casa onde estou agora, feliz pelo sépia que entra pela janela da sala, escrevendo sobre os anos que vivemos juntos, e sobre como é estar sozinha e não procurar um novo amor. De vez em quando você sai com seus amigos e com uns tragos a mais contempla a possibilidade de vir aqui e me levar de volta sem lembrar que um ano se passou e que você nunca vai conseguir de fato me amar, apesar de sentir falta do peso que eu fazia em cima de você e do formato dos meus peitos, além da paciência, do amor desesperado e das teclas de computador soando nos dois lados da casa. Te escrevo esta carta para dizer que eu sempre tive certeza que me curaria, porque desde o momento em que eu entrei naquele avião eu sabia que voltaria, eu sabia que ia te deixar, e sabia que havia uma linha que você não cruzaria nunca. Mas te espero, para sentarmos em um bar, civilizadamente, entre nossos milhares de amigos em comum. E aí eu roçaria meu rosto na sua barba, e seríamos amigos, e você conheceria um homem que me ama com a devoção de um filhote, e voltaria para casa questionando todo o amor que poderíamos ter vivido. Mas não viveríamos jamais. Porque as coisas são como devem ser. Simples assim."

[ ... ]  [in Este é um livro sobre amor de Paula Gicovate]



sexta-feira, 5 de abril de 2019

Melhor








"Só existe uma coisa melhor do que fazer novos amigos: conservar os velhos."         [Elmer G. Letterman]