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"– Oi, Monsieur, o número 16. Porém, não pode ter sido ele. Eu tê-lo-ia visto entrar ou sair do seu camarote.
– Talvez não. Mas voltaremos a isso depois. O que importa é saber o que há a fazer
– Disse Bouc, falando a Poirot. O belga encarou-o.
– Venha, meu amigo – disse Bouc. – Compreende o que lhe vou pedir. Conheço a sua capacidade. Encarregue-se das investigações. Não, não recuse. É um caso grave para nós. Falo pela Compagnie Internationale des Wagons Lits. Quando a polícia Jugoslava chegar, seria muito bom que já lhe pudéssemos apresentar o caso resolvido. Senão, teremos atrasos, aborrecimentos e muitos outros incómodos. Talvez, quem sabe, suspeitas infundadas. Em lugar disto... O senhor resolve o mistério e nós diremos: ocorreu um crime... eis o assassino!
– E se eu não o encontrar?
– Ah! mon cher! – Tornou Bouc, com uma inflexão carinhosa na voz. – Conheço-lhe a reputação. Sei alguma coisa acerca dos seus métodos. Este caso é ideal para o senhor. Investigar os antecedentes de toda esta gente, descobrir-lhe a boa fé, tudo isso custa tempo e incómodos. Mas, acaso, não o ouvi dizer frequentemente que para resolver um caso basta recostar-se na cadeira e pensar? Interrogue os passageiros, veja o cadáver, observe os indícios e depois... Eu confio no senhor. Tenho a certeza de que não exagerou os seus méritos. Recoste-se na cadeira, pense... Use (como eu o ouvi dizer) as pequeninas células cinzentas da mente e descobrirá.
E Bouc curvou-se, deitando ao investigador um olhar amigável.
– A sua confiança comove-me, meu amigo – disse Poirot, impressionado. – Como bem diz, este caso não será tão difícil. Eu mesmo na noite passada... Bem, não falemos agora deste assunto. Na realidade, este problema intriga-me. Eu dizia comigo mesmo, há menos de meia hora, que poderíamos contar com muitas horas de tédio, enquanto estivéssemos aqui. E agora... tenho um problema na mão.
– Aceita então? – Perguntou Bouc, aliviado.
– C’est entendu. Pode confiar-me este caso.
– Bem! Estamos todos ao seu dispor.
– Para começar, gostaria de ter uma planta do comboio Istambul-Calais, com o nome dos respectivos passageiros, dos quais gostaria de ver, também, os passaportes e as passagens.
– Encarregue-se disto, Michel.
O empregado retirou-se.
– Quais são os outros passageiros do comboio? – Perguntou Poirot.
– Neste vagão, somente o doutor Constantino e eu; no vagão vindo de Bucareste, um velho aleijado, conhecido do condutor. Os outros vagões não nos interessam, porque só entraram em serviço depois do jantar. A frente da Istambul-Calais há apenas o vagão-restaurante.
– Parece-me – disse lentamente Poirot – que devemos procurar o nosso criminoso no Istambul-Calais. Naturalmente esta é também a sua opinião – concluiu ele voltando-se para Constantino. O médico anuiu.
– Meia hora antes da meia-noite o comboio parou aqui e nenhum passageiro desembarcou, desde então.
– O criminoso está connosco, e no comboio... – disse Bouc solenemente.
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[in Assassinato no Expresso Oriente de Agatha Christie]